sexta-feira, 22 de dezembro de 2017

                         A BOIADA DO AZAMBUJA

        Governador, eu também tenho um parente lá no Rio Grande de sobrenome Azambuja. Por sinal é uma grande família espalhada por lá, mas este é especial, chama-se Laerte Azambuja,  é fazendeiro, casado com a minha prima a Matilde Domingues, porém o coitado do parente na meia idade, logo que se aposentou como funcionário público, ficou cego e a esposa é seu norte.
        Ele tem uma fazendola em Encruzilhada do Sul, herdou outra dum tio-avô em Rio Pardo e por cima tem um criatório de asininos em Bossoróca.
        Mas bueno, vamos por partes, a patroa carrega ele pra tudo quanto é arremate de gado, pois ele gosta de ver em pensamento aquele gritedo do  leiloeiro, e se tiver por acaso uma novilha, uma vaca ou um touro brasino, não importa o preço, a Matilde lasca o cheque, e o brasino vai pra fazendola, porque ele sempre gostou do gado desse pêlo, pois olha no campo e vê tudo amarelo listrado de preto, parece até uma tigrada de bengala, o Ibama não deixou ele criar um, mas entre galgos e ovelheiros, tudo brasino, tem mais de três dúzias, e falando nisso, até as galinhas ele tentou abrasinar, colocou umas rodes e polacas, e uma vintena de galo Catalão, mas não deu certo, no entanto, entreverado assim no terreiro, preto com amarelo,  parece tudo brasino, até a Matilde, fica brasina quando ele passa o laço nela na cama.
        Num belo dia desses, despontando a primavera, chegaram por lá de helicóptero da FAB, uns compradores de gado da tal de Friboi, e ele entusiasmou-se devido a propaganda do Toni Rama, e como soube  por um vizinho que o dito comprador é filho do homem, e até a Presidenta avaliza os negócios dele, entabulou negociação.  Conversa vai, conversa vem, queriam comprar todo o seu gado brasino, pois só de tapete daquela pelagem iam fazer fortuna. Dona Fulana ia fazer a venda, pois ela tem cidadania italiana, mas não se acertaram no preço, o Laerte, para não vender mesmo os seus brasinos, pediu três vezes mais o preço da arrouba em Araçatuba.
        Depois de uns mates e churrasco ao meio dia e de nova tentativa de compra fracassada, perguntaram se ele não tinha Devon preto para vender, ai ele se interessou, queriam 100.000 bois, e pagavam a vista. Ele balanceou a situação, fez de conta que olhava longe com pena de vender a boiada de Rio Pardo e lascou: “se o negócio serve pra vocês, eu vendo 70.000 Devon preto e completo a carga de cem com 30.000 bubalinos, pode ser”?
        Negócio fechado, os magnatas do Centro Oeste ficaram para jantar um carreteiro e de sobremesa uma pessegada com leite, nesse meio tempo,  perguntaram se por acaso ele não tinha ovelhas para vender.
        O Laerte pigarreou, sentado no seu banco em cima dum pelegaço brasino, meio sem jeito e respondeu: “chegaram tarde. Eu tinha depositado na beira trilhos de Cacequi a Livramento, 1.250 carretel de velo de primeira, mas chegaram os Australianos e arremataram e levaram em vinte e cinco composições toda aquela lãnzinha para o Porto de Montevidéu, cedido melo Mujica, e junto se foi a nossa ovelhama toda, coisa de 300 mil, pois os cangurus tinham um compromisso com a Síria e a Arábia Saudita. Aquela gente, dizem, só comem borrego curdo e cordeiro cristão.
        Mas seu Laerte, como o senhor sabe, lá pras nossas bandas de São Paulo e Minas Gerais, ainda se precisa de muitos asininos, na cidade, nas praias,  nas carvoarias, nos canaviais, nos laranjais, na caatinga,  e agora nessa seca, mais ainda, para carregar as pipas dos açudes para os Paulistanos, então, por acaso o senhor nos indica algum grande produtor?
        Não há de que, estão falando com o próprio.
        Acho que já faz mais de quinze anos que eu tenho esse criatório de burros e mulas lá em Bossoroca, é o meu centro exportador, o Capataz é o Olivo Dutre, mas não é uma criaçãozinha qualquer, é especial, pois importei da chácara do Salvador lá do Tile, uns burrão espanhol e uma mulada ruana, especial, comem pouco, só de milhão pra cima, pois tem só dois dentes, é uma cruza de lhama com mula, apelidei de “mulama”...de quantas mil o Diretor vai  precisar?
        Os Goianos montaram no helicóptero da FAB e se foram à base aérea de Camobi em Santa Maria e contrataram não sei quantos jumbos da Embraer, para levaram os 70 mil Devons, 30 mil búfalos, e a mulada seguiu de trem e caminhões para Minas Gerais.
        Tempos depois seu Laerte Azambuja, soube que a sua mulada, fizera o maior sucesso, principalmente nas Minas Gerais, pois não é que resolveram cruzar a mulada mineira de dois dentes com os jegues do nordeste, e ganharam até a eleição!?

                                                           Odilon Garcez Ayres

11.11.2014.                                          Membro da APL-RS e da ALB-MS.
         


                 

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