1. Teoria do papel vivoOlá, assinantes e colaboradores do RelevO, Neste momento, escrevo um pouco antes da última revisão da edição 192 do Jornal, quase 15 anos depois da primeira edição, em um abril – “o mais cruel dos meses” – de um ano que daqui alguns outros poderá ser visto como um período qualquer entre o caos e a tipografia. A única razão de ser do tempo é evitar que tudo aconteça de uma vez, teria dito Albert Einstein. Se você está lendo isso é porque, de algum modo, temos uma conexão. Não a de fibra ótica, mas alguma outra — sobretudo a que passa por interesses culturais e literários, talvez uma certa inquietação que sobrevive à bateria fraca, ou algum tipo de deslocamento de certa lógica hegemônica de comunicação. Estamos preparando a edição 192 do RelevO. Faltam só 2.031 para chegarmos à mítica edição 2222. Não sabemos bem até onde essa estrada de Gilberto Gil vai dar. Se mantivermos o ritmo mensal, chegaremos lá daqui a mais ou menos um século. Devaneios. Como diria Aldir Blanc, em ‘Resposta ao Tempo’, nós precisamos beber um pouco para ter argumento. Mas enquanto a longevidade segue uma incógnita, a certeza é que estamos vivos agora — circulando, imprimindo e continuando. Não por teimosia ou fetiche vintage, e sim porque o impresso funciona para nós. É direto, não depende de servidor, não pede atualização, não sugere um assistente de IA e nunca nos interrompe com uma notificação de que “você pode gostar disso aqui”. O RelevO não sabe o que você quer, tampouco publica exatamente o que você quer. E isso, acredite, é uma bênção. A internet, por outro lado, parece atravessar a crise existencial de uma meia-idade precoce, repleta de discussões sobre a morte de seu formato. De fato, nos últimos tempos, tem ganhado força a teoria conhecida como “Internet Morta”. A ideia, disseminada em um fórum por uma peculiar conta chamada Illuminati Pirate, é que a rede, antes (por supuesto) cheia de trocas reais entre pessoas, hoje está tomada por robôs — os famosos bots — que curtem, comentam, compartilham e até criam conteúdo sozinhos. Em diversos textos, já repercutimos o estranhamento que nos causam as interações de empresas fazendo humor (publi) com outras empresas, enquanto verificamos a vertigem natural do ciclo dos memes, que, saídos de um nicho, são repetidos à exaustão até serem devidamente enterrados pela inserção na publicidade intrusiva. A cadeia alimentar do meme. Segundo essa teoria, a maior parte do que vemos online não é feita por humanos, mas por sistemas automatizados e inteligência artificial. O resultado? Um ambiente digital cada vez mais aguado, onde as interações autênticas dão lugar a repetições mecânicas, e nossos hábitos, gostos e opiniões passam a ser moldados por algoritmos que nem sabemos direito como funcionam. É como se vivêssemos permanentemente dentro de um episódio ruim de Black Mirror¹. Vivemos, portanto, num looping de mesmice inflada por IAs treinadas para copiar outras IAs treinadas, que copiam textos de ninguém, com um coeficiente negativo de originalidade e surpresa. A promessa de um espaço de troca virou um cemitério de opiniões empilhadas. E ainda dizem que foi a imprensa quem morreu. Pois bem: o RelevO segue impresso. E isso não é resistência romântica — é escolha editorial. O papel não vaza dados, não coleta cookies (nem sabe pra que eles servem) e não te “traquêia”² no Mercado Livre depois de uma pesquisa sobre a sua lombar. A cada edição, oferecemos não uma timeline, mas uma curadoria. Não há rolagem infinita, só começo, meio e fim. Uma edição pensada para ser lida com calma — ou com raiva, se preferir —, mas lida. Um jornal que não te pede cliques nem te recompensa com dopamina digital. Ao contrário da lógica do feed, que te suga até o cansaço como um parasita, o RelevO é feito para interromper fluxos, não para alimentá-los. Não temos pressa, e isso é uma escolha. Ao invés de sermos mais uma aba aberta no seu navegador mental, queremos ser o intervalo. Um suspiro editorial entre uma notificação e outra. Um convite a se demorar pela via da página como quem vira uma esquina inesperada e descobre uma cafeteria nova. Garantimos: aqui, cada texto passou por olhos humanos. Não estamos competindo por segundos da sua atenção. Impresso não é segunda tela, embora possa ser refletido na tela a partir de postagens, comentários, likes. Não somos contra a cultura digital³, e sim contra oligopólios que querem que sejamos apenas consumidores derretidos na montanha-russa de produtos vagos e serviços duvidosos. Mais do que nunca, leitores nos encontram por uma razão simples: estafa. De estar online, de não saber onde termina o conteúdo e começa a propaganda, de consumir e esquecer. E por isso nosso clube de assinaturas é regular, constante — ou, no padrão doente do mercado, estagnado. No fundo, apenas temos um ritmo menos histérico. Talvez nunca cheguemos à edição 2222. Mas a jornada, para nós, já é um acontecimento. E seguimos circulando. Porque o mundo pode ser algorítmico, mas o leitor, a leitora pode a qualquer momento nos amassar como um origami e não aceitar ser reduzido a um mero receptor de ideias gastas. Consuma o RelevO, assine o RelevO! 2. Consultoria literáriaO editor tem vergonha, ruboriza; o editor se sente um picareta; o editor — parafraseando o ditado da mulher de Machado de Assis aos seus conselheiros… o editor também come. Então, se você escreve ou pretende escrever, temos uma boa nova: o RelevO tem uma Consultoria Literária, nosso serviço pra quem quer ouvir verdades (com afeto) sobre o próprio texto e entender mais como funciona o ecossistema literário. E publicar. Nada de elogios vazios, correções genéricas ou dicas infalíveis para o sucesso: a leitura é crítica, cuidadosa e personalizada, envolta por muitos dados e tendências do mercado literário. Nas palavras da casa, “leremos com atenção, paciência, escuta, rigor e gosto”. Pode parecer pouco, mas no mundo dos likes automáticos e das leituras por cima, isso é o nosso editorial. A consultoria é pensada pra quem escreve e quer crescer — seja iniciante, seja autor publicado, seja alguém que escreve no escuro, sem saber se tem jeito pra coisa. A gente lê, comenta, provoca e, se for o caso, aponta caminhos. Funciona assim: você envia seus textos e recebe de volta um parecer detalhado, com sugestões estruturais e técnicas, análise de estilo, e um olhar afinado pra forma e conteúdo. O texto volta pra você cheio de marcas — não como um boletim escolar, mas como uma conversa honesta entre quem escreve e quem lê com seriedade. Como diz o serviço: “a devolutiva é escrita por uma pessoa que pensa, formula e entrega um parecer exclusivo”. Além disso, agendamos um encontro presencial ou virtual para situar o material no contexto macro da nossa área, pensando desde o original, passando pelas casas de publicação, estratégias de lançamento e, por fim, o papel do escritor no cenário atual. Então, se você tem um conto, crônica, poesia ou outro tipo de delírio textual esperando uma boa leitura crítica, mande para nós. Não é necessário ter um livro pronto para contratar o serviço, embora uma quantidade mais significante de material naturalmente forneça margem maior de observações. 3. Testes de plataformaEm breve, testaremos a migração de todos os assinantes do RelevO como assinantes pagos do Substack. Estamos demorando para fazer isso porque, basicamente, temos receio de fazer cagada. Para quem assina o RelevO, nada muda. Você vai receber tudo que já recebe, e a ideia é justamente abrir margem para um canal de exclusividade. Hoje, a assinatura do Substack não tem relação direta com a assinatura do RelevO (embora você possa contribuir diretamente por aqui). Queremos unificar essas informações de modo que alguém possa tanto ser um assinante digital do RelevO (pagando apenas pelos textos do Substack) como receber nossos conteúdos desta plataforma porque assinou o impresso. De todo modo, você não precisa fazer nada. Até breve, Daniel Zanella 1 Ou seja, todos depois de 2013! Brincadeira, brincadeira… 2 Nem traquéia, isto é, traqueia. 3 Inclusive, muito ao contrário, somos até românticos com aquele imaginário de internet de décadas atrás, já devidamente abandonado e substituído por anúncios, paywall e o esfíncter do Mark Zuckerberg. Como aquela lógica antiga de que um cínico é nada menos que um idealista desiludido. |
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segunda-feira, 28 de abril de 2025
Começou a circular o impresso 2222?
terça-feira, 15 de abril de 2025
Ayrton Senna, campeão semiótico
EDITORIALBom dia! Bem-vindo(a) à Enclave #132, a newsletter que só faz baliza em casa. Estávamos de férias. A edição de abril do Jornal RelevO está disponível no nosso site. Aliás, até o mês que vem, pretendemos classificar todos os assinantes do Jornal como assinantes pagos aqui do Substack, finalmente equivalendo as duas plataformas. Em outras palavras, se você assina o RelevO, certamente vai receber o que já recebe. Já seu vizinho que não assina será limitado a migalhas, retalhos, a xepa da xepa. Na verdade, não sabemos, mas testaremos. Por via das dúvidas, assine o RelevO. Por favor. Ainda mais se você gosta do nosso trabalho e fica com vergonha de nos ver passando o chapéu regularmente. Aliás, quem quiser contribuir com a edição de maio já tem um como e um onde (mas dificilmente um porquê…):
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Nosso MaradonaA empolgação com o tema me levou a ler a nova edição de Ayrton: o herói revelado, de Ernesto Rodrigues. Um baita livro. Por meio dele, conseguimos entender um pouco mais do apelo dessa figura sagrada para a mitologia brasileira. Também me levou a comprar um boné pela primeira vez na vida. Famoso pelos momentos de silêncio que antecediam respostas, Senna emanava uma curiosa melancolia. Era diferente dos pilotos de sua época, o que não à toa lhe rendeu o maldoso boato – empurrado por Nelson Piquet, tricampeão mundial e chofer do Bolsonaro – de que era, vejam só… gay.¹ Também era um obcecado. Foi um gênio técnico da Fórmula 1 porque dominava o carro com uma precisão sobrenatural. Sua capacidade de ler as condições da pista, especialmente sob chuva, era fora de série, bem como o esforço e a competência para relacionar os dados do veículo com a pista, otimizando cada trecho. Mas a parte técnica me interessa muito menos, até porque não tenho a menor condição de avaliá-la. Me interessa mais entender de que forma sua personalidade misturava competitividade feroz e uma sensibilidade quase poética. Um sangue latino. Óbvio, morrer jovem e tragicamente promove qualquer personalidade. A morte de Bruce Lee compõe a imagem de Bruce Lee, o que também vale para Marilyn Monroe e, claro, toda aquela lista de músicos. Mas um esportista em ação, um ídolo nacional… para quem não viveu, é difícil imaginar.² Exaltado e promovido pela mídia? Sem dúvida. Mas isso só se sustenta ao longo do tempo quando alicerçado por substância. E Senna, como vim a descobrir, tinha muita. Sabia falar, mas, principalmente, sabia como e com quem falar. Ajustava seus discursos porque era acima de tudo um sujeito demasiado inteligente. Sua entrevista com o também tricampeão Jackie Stewart – Sir Jackie Stewart – sintetiza esse atributo. Senna se defende diante de uma lenda, abraça seu ponto de vista, argumenta e não abre mão de sua convicção. Fora de sua língua nativa, o que não é um detalhe irrelevante. E ainda profere uma das frases mais famosas da história da Fórmula 1: “If you no longer go for a gap that exists, you're no longer a racing driver”.³ Essa convicção – a capacidade de envolver-se completamente e não arregar, principalmente diante deles, os colonizadores europeus [outro detalhe nada irrelevante] – é um dos vários elementos que transformam Ayrton Senna no nosso Maradona. Não é uma coincidência que o argentino adorava o brasileiro. Aliás, é muito comum encontrar, no YouTube, comentários na linha “soy argentino, pero Senna…”. O fato é que Ayrton Senna estava no famoso lugar certo, na hora certa e capturando o zeitgeist certo em um esporte em que pessoas se divertem (e morrem ou morriam) a 300 km/h. Parece difícil que novos pilotos – ou atletas em geral – consigam construir tamanha aura, afinal também falamos de um tempo menos cronometrado. Hoje não há grande misticismo, uma vez que acompanhamos tudo, o tempo todo, em excesso. Com RP infinito. Havia ali um sinal de piloto à frente do tempo, algo complicado de mensurar com as margens menores de genialidade em uma modalidade já superestruturada. Depois da morte de Senna – e do austríaco Roland Ratzenberger, na mesma maldita pista, no mesmo maldito fim de semana –, a própria Fórmula 1 ficou mais segura. E talvez tenha se encerrado de vez a era dos aventureiros que exploravam o limite da velocidade sob um risco genuíno, ainda não completamente decifrado. No próximo 1º de maio, também sentirei um vazio estranho, mesmo sem ter presenciado nada, sem saber diferenciar um Verstappen de um Vettel ou assistir mais que o tempo de um pit stop. Ayrton não conseguiu apenas imortalizar Senna. Num país de autoestima inexplicavelmente baixa, conseguiu fazê-lo mantendo-se, acima de tudo, Ayrton Senna da Silva. Um brasileiro capaz de unir brasileiros protagoniza o verdadeiro milagre e merece, portanto, as maiores honrarias. Toca o tema da vitória, p**ra! BAÚUrsula Le Guin
Ursula K. Le Guin, Como criar histórias, 1998. Ed. Seiva, 2024. 1 As especulações sobre quem Senna seria se estivesse vivo (que, em suma, resumem-se a “em quem ele votaria?”) podem ser divertidas para uma conversa despretensiosa entre amigos, mas me parecem um desperdício de imaginação quando levadas a sério. 2 Creio que o mais próximo disso que minha geração testemunhou foi o acidente da Chapecoense. Também no futebol, outro detalhe: o promissor Dener havia morrido menos de duas semanas antes de Senna. 3 Algo como “Se você não tenta se colocar em um espaço que existe, então você não é mais um piloto”. © 2025 Jornal RelevO |
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