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terça-feira, 28 de outubro de 2025

Crônica do dia: Charlotte, e o triângulo vermelho!!! O trítono para além da escuridão

Crônica do dia: Charlotte, e o triângulo vermelho!!! O trítono para além da escuridão

 

''Eu navego pelo mar...

Da tranquilidade!

Eu tenho esperanças renovadas!

Pois tenho pensamentos probos.

Eu tenho pensamentos bons,

Eu sou uma pessoa muito feliz...

Mesmo sabendo...

Que tenho um longo...

E tortuoso caminho para percorrer! ''

Samuel da Costa

 

            O som da pá a cavar soa como a Diabolus in música, o trítono, aquele demoníaco intervalo musical de três tons inteiros tão temidos na longínqua Idade Média. Pelo menos para Gertrudes Martin, agora Katharina Dúbios era algo tão comum como acordar pela manhã.  

            — Será que ele dá conta do recado? — Perguntou com desdém Gertrudes Martin.

            — Dá conta sim! Na minha casa é ele que racha a lenha! — Respondeu Katharina Dúbios.

            — Na minha casa temos o Felisberto! — Retrucou Gertrudes Martin

            — Nossa senhora, que privilégio! — Comentou Katharina Dúbios.

            As duas mulheres de meia idade, levantaram as garrafas individuais de gasosas e brindaram. Estava de costas para o mar bravio, estavam sentadas em cadeiras de praia, usavam óculos escuros, estavam vestidas à moda veranistas acidentais em uma praia isolada agreste pouco frequentada e difícil acesso. Olhavam Klaus Von Marx, com as mangas da camisa branca arregaçada, com uma pá cavando uma cova rasa.

            — Tu conferiste se Margarida Cohen, está mesmo morta? — Perguntou a paisagista Gertrudes Martin.

            — Margarida Cohen? Margarida Correia ora bolas! E é claro que está viva minha querida, a sirigaita metida a bailarina está somente desmaiada — Respondeu Katharina Dúbios, que por anos trabalha como boticária.

              — Bom saber! — Disse Gertrudes Martin

            E de fato assim que Klaus Von Marx, ou Cláudio Marques jogou o corpo da bailarina na cova rasa, ela se mexeu, para o desespero do médico prussiano. Que se virou em abrupto para as duas mulheres, elas que respetivamente apontavam e dispararam simultaneamente pistolas Luger P08 nos ombros do médico, que se projetou para trás e caiu em cima da bailarina que murmurava palavras desconexas.

            — Agora é a nossa vez de trabalhar um pouco! — Falou Katharina Dúbios um tanto chateada.

            — Um pouco de esforço físico faz bem e antes que perguntes, vamos plantar uma linda jabuticabeira hoje.

            As duas mulheres se levantaram, calçaram as suas luvas de couro cru, pegaram as pás que estavam ao lado das cadeiras de praia, em simultâneo jogaram as pistolas Luger P08 na cova rasa. E começaram a jogar terra em cima do casal de amantes clandestinos.

            — E antes que me pergunte comprei as passagens de trem para a cidade mais longe que pude encontrar e doei para um casal desconhecido — Falou Katharina Dúbios, enquanto jogava terra na cova rasa.

              — Nos nomes de Margarida Correia e Cláudio Marques creio eu! E eu também comprei passagens de navio para o feliz casal Klaus Von Marx e Margarida Cohen, vão embarcar daqui a pouco, também fiz a caridade de doar as passagens para um casal desconhecido e suspeito — Confidenciou Gertrudes Martin para a sua cúmplice.

            As ondas quebravam na orla marítima, acomodadas em suas respectivas cadeiras de praias, as idosas Katharina Dúbios e Gertrudes Martin estavam em total silêncio, estavam usando um biquinho de peça única e atrás das duas respeitadas e bem sucedidas senhoras. As duas amigas levantaram os seus respectivos refrigerantes e deram um brinde, um pouco atrás das duas veranistas acidentais, uma frondosa jabuticabeira reinavam absoluta, dando os seus frutos por anos. Frutos que por algum motivo eram ignorados por qualquer ser vivente, ao longe um galeão espanhol despontou no horizonte, era um teatro pirata bufo para entreter turistas naquela baixa temporada.      

Fragmento do livro: Do diário de uma louca, texto de Clarisse Cristal, poetisa, contista, novelista e bibliotecária em Balneário Camboriú, Santa Catarina.

Arte digital de Clarisse Costa, é designer gráfico, poetisa novelista, contista e cronista em Biguaçu, Santa Catarina.  

 

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